Chuvas x cidades
MARCELO PORTOCARRERO
A mídia segue mostrando o resultado catastrófico da ação das chuvas nas cidades. Invariavelmente, a principal causa disso é o desordenado crescimento dos centros urbanos, fruto, não da falta de Planos Diretores, mas do descumprimento de suas diretrizes.
Assim, a cada governo assistimos incrédulos o abandono de caros projetos de desenvolvimento urbano, injustificadamente substituídos por outros, que representarão novos custos e novos abandonos, perpetuando o caos em nossas cidades.
Aí vêm as chuvas, que encontram cada vez menos áreas verdes e mais asfalto, mais concreto, portanto, mais impermeabilização. Então, o “meio ambiente” deixa de ter “ambiente” para ser somente “meio”, a transportar água em volumes crescentes, que a cada esquina se avolumam e transformam nossas redes pluviais, nossos canais e rios nisso que estamos vendo.
Enquanto a cobertura da imprensa permanecer centrada nas consequências físicas e sociais das (in)evitáveis torrentes que inundam as ruas e as casas dos cidadãos pegos de surpresa pela violência das aguas, a impunidade prevalecerá sobre a necessidade.
Seriam essas catástrofes realmente inevitáveis?
Estariam nossos projetos de infraestrutura urbana considerando erroneamente as normas que orientam o dimensionamento destes tipos de obra?
Será que as execuções dos projetos estão seguindo rigorosamente o que determinam suas especificações e detalhamentos técnicos?
É preciso pensar e repensar sobre as indagações acima apresentadas.
Não se trata, a essa altura, de procurar responsáveis por antigos problemas. Já estamos cansados de ver essa iniciativa acabar em pizza. Devemos nos concentrar em soluções adequadas, mas não as do tipo que causam as catástrofes que estamos assistindo devastarem as cidades da China, que só pensa em ocupar os espaços antes verdes, com seus gigantescos arranha-céus e enormes condomínios; pavimentar largas avenidas/rodovias, com múltiplas faixas e implantar enormes e estéreis “praças populares”, tudo para que nelas caibam mais veículos e pessoas, quase todos locais nus, sem áreas verdes ou vegetação natural suficiente (e necessária); com seus rios transformados em canais impermeabilizados, e enormes represas, como a da Usina de Três Gargantas, que, dizem, estaria até afetando a rotação da Terra, por ter um reservatório de cerca de 39,3 quilômetros cúbicos de água. Um verdadeiro contraste com o que era no passado.
Enfim, antes de mais nada, devemos evitar novos erros, ou melhor, a continuação do cometimento de erros antigos. É preciso examinar com rigor quais as causas a partir dos efeitos que aí estão, como no caso do transporte de massa da nossa capital, que até agora não passa de conversa fiada de todos os poderes envolvidos. Um verdadeiro jogo de empurra-empurra, onde as vítimas são sempre as mesmas, os usuários, os cidadãos.
Temos um universo enorme de pesquisas e checagens a fazer, a começar por rever as normas que possam estar ultrapassadas, pesquisar novos materiais, novas soluções técnicas e adotarmos as que melhor resolvam os problemas das cidades e suas populações, não somente os dos políticos e suas armações, como costuma acontecer em obras de infraestrutura.
Uma coisa é certa, temos que agir rápido, pois estamos ficando cada vez expostos a riscos inaceitáveis.
Marcelo Augusto Portocarrero é engenheiro civil.
*Os artigos são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião do Ael News.