Lei que instituiu Dia da Mulher Negra completa dois anos
Há dois anos, o município de Cuiabá inseriu em seu calendário oficial o dia 25 de julho, Dia Municipal de Tereza de Benguela e da mulher negra cuiabana, data que foi instituída pela lei 6.723, de 19 de novembro de 2021.
Na capital, mais de 64% da população feminina se declara negra. A lei, de autoria da vereadora Edna Sampaio (PT), adere ao calendário nacional, onde já está incluso, desde 2014, o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha, que faz parte do calendário dos movimentos sociais em todo o mundo.
Também reverencia a líder negra Tereza de Benguela que, entre os anos de 1750 e 1777, comandou o Quilombo de Quariterê, no Vale do Guaporé, em Mato Grosso. Sob sua liderança, negros e indígenas que viviam no local conseguiram resistir por mais de vinte anos à escravização.
A lei é um instrumento de debate sobre a condição dessas mulheres, que são alvo tanto do racismo quanto da violência de gênero, sendo historicamente subalternizadas e excluídas do acesso às políticas públicas.
Elas compõem 62% das vítimas de feminicídio no país, segundo a Anistia Internacional. Em relação à saúde, possuem as piores taxas de morbidade e mortalidade. Um exemplo disso é que o risco de óbito por câncer é duas vezes maior entre mulheres negras quando comparadas às brancas.
No mercado trabalho, elas estão em posições de menor prestígio e remuneração, têm presença tímida em ocupações de maior segurança financeira e apresentam maior taxa de desemprego, conforme o Dossiê Mulheres Negras: retrato das desigualdades de gênero e raça, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Além disso, os lares chefiados por mulheres negras apresentam os piores indicadores de insegurança alimentar, segundo a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.
Edna destacou o pioneirismo e a representatividade da líder quilombola Tereza e os desafios da mulher negra hoje. “Tereza de Benguela liderou e organizou o quilombo, de forma política, criando o parlamento e estratégias políticas de participação, de organização daquele espaço de resistência e também liderou a produção econômica que alimentou centenas de pessoas por décadas”, disse Edna.
“Representa muito bem a força e a engenhosidade das mulheres negras que precisaram e precisam ainda sobreviver a todas as formas de opressão numa sociedade ainda marcada pela desigualdade, pelo racismo e pelo machismo”.
Cuiabana de “tchapa e cruz”, Edna buscou ainda homenagear a garra da mulher local e instituir um instrumento de cobrança por políticas públicas.
Ela também é autora do Estatuto de Promoção e Igualdade Racial – lei 6.882/2022 – que traz diretrizes de políticas públicas para a população negra e defende a garantia de saúde e de proteção às mulheres.
“Nós, mulheres, precisamos reafirmar o direito pleno ao exercício da nossa cidadania. Isso tem a ver com o acesso a políticas públicas, que devem existir no município, no estado, e com o acesso aos espaços de poder e de representatividade, com a equidade na participação na política”, disse a vereadora.
“Nós, que viemos das classes trabalhadoras, dos movimentos sociais, mais do que participar das instituições, queremos ganhar as ruas, reforçar nos movimentos sociais o que sempre fizemos, em defesa dos direitos”.
O Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha foi instituído durante o 1º Encontro de Mulheres Afro-Latino-Americanas e Afro-caribenhas, ocorrido em 1991, em Santo Domingo, capital da República Dominicana.
Este evento histórico marcou o debate das mulheres negras sobre suas demandas, que, na época, não eram enxergadas nem pelo movimento negro nem pelo movimento feminista.
A iniciativa partiu de uma rede de coletivos de mulheres negras criada no início dos anos 1990 para discutir o combate ao machismo e ao racismo. No Brasil, a data foi instituída pela ex-presidente Dilma Rousseff que, por meio da lei 12.987/14, nacionalizou a comemoração, prestando homenagem à líder Tereza. Com esse gesto, ela reconheceu um marco estratégico do movimento de mulheres negras.