A seleção adversa e o risco moral nas contratações públicas
LEONAN ROBERTO
ornecimento de água universal, coleta e tratamento de esgoto em todas as casas, uma rede física de distribuição de energia estável, escolas e hospitais bem construídos e com acessibilidade, ruas e rodovias sem buracos… Sem dúvidas, as obras estruturantes fazem parte de tudo o que o cidadão deseja ver no seu dia a dia. Mas por que a implementação dessas políticas públicas por vezes é tão difícil?
São dezenas de causas e concausas que revelam as dificuldades do Poder Público, desde a concepção do plano de governo e desenho do portfólio de projetos das entregas públicas, passando pela competência na modelagem e exercício gerencial das obras até, por fim, chegar à execução concreta e operacional. Não bastasse, fazer tudo isso com responsabilidade fiscal para o prolongamento da política pública no tempo é um desafio que poucos gestores conseguem superar.
“Obras estruturantes fazem parte de tudo o que o cidadão deseja ver no seu dia a dia. Mas por que a implementação dessas políticas públicas por vezes é tão difícil?”
Como boa parte das políticas são executadas por meio de contratos com empresas, quero trazer dois conceitos do campo econômico aplicáveis às contratações públicas que prejudicam o resultado esperado, são eles, a seleção adversa e o risco moral.
Consoante ensina o professor Marcos Nóbrega, a seleção adversa (adverse selection) nas licitações se dá quando o Poder Público é incapaz de separar o bom licitante do mau e acaba por afastar as melhores empresas do mercado. Se a gestão do ente público, por exemplo, tem um histórico de dar calote, de pagar com atraso ou é marcada por episódios televisionados de corrupção, certamente boas empresas não vão desejar ingressar nesse ambiente. Além disso, a seleção adversa também ocorre quando a licitação não consegue filtrar a participação de apenas empresas qualificadas, com critérios falhos no edital.
Já o risco moral (moral hazard) se refere ao comportamento inadequado de uma empresa após o contrato ser assinado, adotando condutas negligentes ou até contrárias à expectativa depositada, segundo os diferentes contextos, em verdadeiro oportunismo. Cite-se, por exemplo, um pedido de uma empresa de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato fora da teoria das áleas ou antes mesmo de iniciar a execução de uma obra pública para tentar suprir o preço baixo que deu para ganhar a licitação (famoso “mergulho” no preço).
Ciente desse quadro, o Estado de Mato Grosso tem adotado dezenas de medidas administrativas e jurídicas robustas em suas contratações públicas, incluindo a fiscalização da atuação proba de seus agentes, a padronização de editais e a modelagem de matriz de riscos compatível com o mercado, tudo em harmonia com a Nova Lei de Licitações e Contratos (Lei 14133/2021).
Em síntese, atenuar os problemas da seleção adversa e do risco moral nas contratações públicas é um dever do gestor público para o alcance do resultado esperado pelo cidadão e o efetivo respeito a seus direitos fundamentais.
Leonan Roberto de França Pinto é Procurador do Estado de Mato Grosso
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