A múmia da ‘Mulher Misteriosa’ está no Museu Nacional de Varsóvia, na Polõnia — Foto: Warsaw Mummy Project

A múmia da ‘Mulher Misteriosa’ está no Museu Nacional de Varsóvia, na Polõnia — Foto: Warsaw Mummy Project
Hun enterrado há mais de 1500 anos com os apetrechos de guerreiro, incluindo uma espada, oferendas de bebida e comida, e um chicote de montaria — Foto: Boglárka Mészáros/BHM Aquincum Museum

Os hunos foram um povo antigo, formado por guerreiros saqueadores, que ficaram conhecidos na história ocidental por seu papel no declínio do Império Romano, por volta de 370 d.C., sob o comando do general Átila. Apesar deste destaque, os historiadores ainda apresentam muitas dúvidas sobre como e de onde esse coletivo surgiu, bem como o que os motivava a apresentar tamanho comportamento bélico.

Por muito tempo, especulou-se que o termo “hun” derivava da palavra “xiongnu”, que se refere à população nômade das estepes que ameaçaram as fronteiras da China entre 200 a.C. e 100 d.C. Mas seriam eles membros da mesma comunidade? Até então, as evidências arqueológicas, baseadas nos túmulos de ambas as populações, mostraram-se inconclusivas.

No entanto, a partir de uma coleta de DNA pertencente a 370 esqueletos de hunos enterrados entre 400 e 500 d.C. nas planícies do que hoje é a Hungria, um novo estudo parece ter, por fim, encontrado a sua verdadeira origem. Os resultados da investigação foram compartilhados em um artigo no periódico Proceedings of the National Academy of Sciences, publicado nessa segunda-feira (24).

Proximidade com os xiongnus

Em entrevista à revista Science, Guido Gnecchi Ruscone, líder da iniciativa, afirma que ele encontrou nos túmulos hunos diversos esqueletos cujas características físicas e pertences funerários os marcavam como diferentes de outras populações conhecidas. Inclusive, diga-se de passagem, dos próprios xiongnus.

Dentre suas principais particularidades, alguns exemplares descobertos tinham crânios que provavelmente foram amarrados na infância para crescer em um formato alongado artificialmente. Outros foram enterrados com cabeças e peles de cavalos, sugerindo conexões com cavaleiros que viviam nas vastas pradarias que se estendem pela Eurásia central.

Hunos em batalha com os alanos, gravura da década de 1870 baseada em um desenho de Johann Nepomuk Geiger (1805-1880) — Foto: Wikimedia Commons
Hunos em batalha com os alanos, gravura da década de 1870 baseada em um desenho de Johann Nepomuk Geiger (1805-1880) — Foto: Wikimedia Commons

Outra curiosidade identificada foi que a composição genética de algumas pessoas sugeria que elas compartilhavam ancestralidade com aquelas enterradas em sepulturas elaboradas pertencentes à elite xiongnu. Esses indivíduos haviam sido enterrados cerca de três séculos antes, próximo das terras altas da Mongólia, a cerca de 5 mil km.

Fragmentos idênticos de DNA demostraram que determinados esqueletos possuíam uma relação direta com os guerreiros xiongnu. “Pela nossa análise, eles eram descendentes diretos ou descendentes diretos de parentes próximos”, explica Ruscone. “É plausível que eles fizessem parte de um grupo que mantiveram viva a cultura xiongnu”.

Ascendência mista

Percebeu-se, contudo, que os ascendentes de xiongnu eram apenas uma pequena minoria entre os hunos enterrados no sítio húngaro. A maioria dos esqueletos carregava pouca contribuição genética de fontes asiáticas. A evidência, em outras palavras, não aponta para uma invasão organizada e em massa pelas estepes.

Isso sugere que, após o colapso do Império Xiongnu há 1900 anos, suas elites despedaçadas se espalharam pelo território. Enquanto alguns ficaram na região já ocupada por seus antepassados, outros podem ter migrado para o oeste em busca de novas oportunidades de vida.

“Foi um esforço perigoso. É um risco calculado se mover, especialmente através do território de outras comunidades. Sabe-se que esse processo implica em perdas de recurso e mesmo de outros humanos”, aponta Bryan Miller, coautor do novo artigo. “É um feito incrível ter conseguido atravessar até a Europa”.

Mesmo que apenas um pequeno grupo tenha sobrevivido à viagem, as evidências sugerem que ele se adaptou bem às culturas locais. Ao longo de 300 anos, a população conseguiu se unir com outros povos da Europa central e prosperar, carregando consigo o legado genético xiongnu.

“O fato de que a população do Império Huno era tão diversa geneticamente reflete uma rede complexa de interação genética em vez de uma única migração em massa”, conclui Zsófia Rácz, co-autora do projeto, ao portal ZME Science. “Trata-se de uma grande colcha de retalhos de ancestralidades”.

(Por Arthur Almeida)

Astrogildo Aécio Nunes

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