A Inteligência Artificial exterminará a advocacia?
REGIANE FREIRE
No mês de agosto comemoramos o dia do advogado e nesse mês completo dez anos de advocacia. E fazendo um balanço do tempo em que comecei a advogar, comparando com os desafios atuais, percebo que, a influência da tecnologia em nosso sistema jurídico, ajudou o advogado a trabalhar sem sair do escritório. Mas será que essa “ajuda” põe em risco a nossa profissão?
Quando comecei em 2013, o processo eletrônico estava engatinhando. Os processos físicos dominavam os escritórios. Não tinha outra opção a não ser presencial para as audiências e atendimento ao cliente. Para ter acesso ao processo, era necessário se deslocar ao Fórum, fazer carga, levá-lo ao escritório para análise, tirar cópia e, dependendo da quantidade de volumes, carregá-lo só com a ajuda de um carrinho. Para os protocolos, o advogado precisava imprimir a peça e uma cópia, sempre! E eram feitos no Fórum, com término às 19 horas. Eram tempos difíceis.
Em 2020, com a chegada da pandemia, o Judiciário precisou encontrar solução para dar continuidade as demandas judiciais, em um momento que não tínhamos certeza de quando a pandemia e as restrições sociais acabariam, e graças a tecnologia que incorporou de vez a rotina dos escritórios e do sistema jurídico, foi possível dar continuidade ao trabalho, extirpando grande parte dos procedimentos manuais.
Os processos passaram a ser eletrônicos, as audiências onlines, dispondo o advogado a opção de escolher audiência presencial; as idas e vindas aos cartórios judiciais diminuíram, graças ao acesso aos processos pelo site do Tribunal. Apesar de nem todo balcão de atendimento ser 100% tecnológico, é possível entrar em contato com o escrevente por telefone, e-mail, WhatsApp ou, quem sabe, reunião online, resolvendo o problema do seu cliente sem sair do escritório, evitando custo com o deslocamento ou a contratação de advogado correspondente.
O lado bom de toda essa facilidade que a tecnologia nos proporciona é a redução de custo e tempo. Quando comecei, meu dia era divido em duas partes: pela manhã, peticionar e atender cliente, e a tarde, Fórum. Dependendo da complexidade do caso, era impossível terminar a peça na parte da manhã, o que ficaria para o dia seguinte, acumulando com outros prazos.
No período da tarde, as audiências – que geralmente atrasavam – eram divididas com visita nas varas judiciais para fazer carga – certamente estaria lotada de advogados – ou despachar com o juiz. Se eu conseguisse levar cinco processos, estava no lucro. Lembrando que o horário de atendimento era das 12:00 às 19:00 e eu precisava voar. A rotina era exaustiva, desgastante ao corpo e a mente.
Hoje, o processo eletrônico elimina todo esse sacrifício. Basta o advogado ter o certificado digital e pronto! Temos ao nosso dispor os processos, exceto os que correm em segredo de justiça, disponível somente aos advogados das partes.
Com a Inteligência Artificial dominando nossa rotina, o advogado consegue trabalhar em qualquer lugar, angariando clientes em outras Comarcas. O advogado bom de relacionamento, consegue expandir seu trabalho em outros Estados sem sair do escritório, basta um computador e internet, e é claro! Habilidade nas relações pessoais e competência em entregar bom resultado.
Alguns escritórios nem perde tempo com petições, pois existem programas que montam as peças e o profissional só faz algumas alterações. O ChatGPT está aí, bombando, produzindo relatórios e elaborando documentos. Basta saber formular a pergunta que a ferramenta lhe entrega um modelo.
Toda essa tecnologia trouxe benefícios ao sistema judicial, mas, alguns especialistas afirmam que a IA exterminará a advocacia, uma vez que, não será necessário o trabalho humano para realizar tarefas repetitivas, como, por exemplo, peticionar. É o que diz o cientista Silvio Meira: “profissões que envolvem tarefas repetitivas…, como advogado ou cirurgião… estão particularmente em risco devido a aplicações de IA.”[1]
A advocacia não se restringe em interpretar lei e escrever, ela exige muito mais do profissional, como uma boa relação pessoal com clientes e colegas de profissão.
Saber lidar com o sentimento do outro, suas necessidades e dificuldades, são habilidades que nenhuma máquina poderá fazer. Não creio que a IA extermine a advocacia. É fato que algumas atividades executadas pelo estagiário ou advogado correspondente, foram substituídas pela IA, mas a parte humana não poderá ser realizada por uma máquina.
O momento exige renovação para não ficarmos obsoleto, como as funções que eu fazia no início da carreira e que hoje só serve para contar história. No final, as pessoas vão comprar de pessoas em quem confiam.
Regiane Freire é advogada
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