A história mais antiga do mundo? Astrônomos dizem que mitos globais sobre as estrelas das “sete irmãs” podem remontar a 100 mil anos

A história mais antiga do mundo? Astrônomos dizem que mitos globais sobre as estrelas das “sete irmãs” podem remontar a 100 mil anos
Especialista afirma que há 100.000 anos atrás a maioria das pessoas realmente teria visto sete estrelas no aglomerado. — Foto: Unsplash/ Ryan Hutton

No céu do hemisfério norte, em dezembro, há um belo aglomerado de estrelas conhecido como Plêiades, ou as “sete irmãs”. Olhando com atenção, você provavelmente contará seis estrelas. Então, por que dizemos que são sete?

Muitas culturas ao redor do mundo referem-se às Plêiades como “sete irmãs” e contam histórias bastante semelhantes sobre elas. Após estudar cuidadosamente o movimento das estrelas, acreditamos que essas histórias podem datar de 100.000 anos atrás, quando a constelação tinha uma aparência bastante diferente.

As irmãs e o caçador

Na mitologia grega, as Plêiades eram as sete filhas do titã Atlas, condenado a sustentar o céu por toda a eternidade, incapaz de proteger suas filhas. Para salvá-las de serem atacadas pelo caçador Órion, Zeus as transformou em estrelas. Porém, a história conta que uma das irmãs se apaixonou por um mortal e se escondeu, explicando por que vemos apenas seis estrelas.

Histórias semelhantes são encontradas entre os grupos aborígenes da Austrália. Em muitas culturas aborígenes australianas, as Plêiades são um grupo de jovens meninas, frequentemente associadas a cerimônias e histórias sagradas femininas. As Plêiades também desempenham um papel importante nos calendários e na astronomia aborígenes, marcando, em alguns casos, o início do inverno com seu primeiro surgimento ao amanhecer.

Próximo às Sete Irmãs no céu está a constelação de Órion, frequentemente chamada de “a panela” na Austrália. Na mitologia grega, Órion é um caçador, e em muitas culturas aborígenes ele também é visto como um caçador ou um grupo de jovens homens. A antropóloga Daisy Bates relatou que povos do centro da Austrália viam Órion como um “caçador de mulheres”, especificamente das mulheres nas Plêiades. Muitas histórias aborígenes dizem que os jovens de Órion estão perseguindo as sete irmãs – e uma delas morreu, está escondida, é muito jovem ou foi raptada, o que explica por que apenas seis são visíveis.

A irmã perdida

Histórias semelhantes sobre a “irmã perdida” das Plêiades são encontradas em culturas europeias, africanas, asiáticas, indígenas americanas e aborígenes australianas. Muitas culturas consideram o aglomerado como tendo sete estrelas, mas reconhecem que normalmente apenas seis são visíveis, criando histórias para explicar por que a sétima está invisível.

Uma interpretação aborígene australiana da constelação de Órion do povo Yolngu do norte da Austrália. As três estrelas do cinturão de Órion são três jovens que foram pescar em uma canoa e pegaram um peixe-rei proibido, representado pela Nebulosa de Órion, baseado  em relatos orais e escritos Yolngu. — Foto: Ray Norris
Uma interpretação aborígene australiana da constelação de Órion do povo Yolngu do norte da Austrália. As três estrelas do cinturão de Órion são três jovens que foram pescar em uma canoa e pegaram um peixe-rei proibido, representado pela Nebulosa de Órion, baseado em relatos orais e escritos Yolngu. — Foto: Ray Norris

Como as histórias aborígenes australianas podem ser tão parecidas com as gregas? Antropólogos antes pensavam que europeus trouxeram a história grega para a Austrália, onde foi adaptada pelos povos aborígenes. No entanto, as histórias aborígenes parecem ser muito mais antigas que o contato europeu. Além disso, a maioria das culturas aborígenes australianas teve pouco contato com o resto do mundo por pelo menos 50.000 anos. Então, como essas histórias se assemelham?

Barnaby Norris e eu sugerimos uma resposta em um artigo que será publicado pela Springer no próximo ano no livro Advancing Cultural Astronomy. Uma prévia está disponível aqui.

Todos os humanos modernos descendem de pessoas que viviam na África antes de iniciarem suas migrações há cerca de 100.000 anos. Será que essas histórias das sete irmãs são tão antigas? Será que todos os humanos carregaram essas histórias consigo enquanto viajavam para a Austrália, Europa e Ásia?

Estrelas em movimento

Medições cuidadosas feitas pelo telescópio espacial Gaia e outros mostram que as estrelas das Plêiades estão se movendo lentamente no céu. Uma estrela, Pleione, está agora tão próxima da estrela Atlas que parecem uma única estrela a olho nu.

No entanto, se retrocedermos 100.000 anos, com base no movimento das estrelas, Pleione estava mais afastada de Atlas e seria facilmente visível a olho nu. Assim, há 100.000 anos, as pessoas realmente viam sete estrelas no aglomerado.

Uma simulação mostrando como as estrelas Atlas e Pleione teriam aparecido a um olho humano normal hoje e em 100.000 a.C — Foto: Ray Norris
Uma simulação mostrando como as estrelas Atlas e Pleione teriam aparecido a um olho humano normal hoje e em 100.000 a.C — Foto: Ray Norris

Acreditamos que esse movimento das estrelas pode ajudar a explicar dois enigmas: a semelhança das histórias gregas e aborígenes sobre essas estrelas e o fato de tantas culturas chamarem o aglomerado de “sete irmãs”, mesmo que hoje vejamos apenas seis.

Será possível que as histórias das Sete Irmãs e de Órion sejam tão antigas que nossos ancestrais as contavam ao redor de fogueiras na África, há 100.000 anos? Seria essa a história mais antiga do mundo?

Agradecimento

Reconhecemos e respeitamos os proprietários tradicionais e os anciãos, passados e presentes, de todos os grupos indígenas mencionados neste artigo. Todo o material indígena foi encontrado em domínio público.

*Este artigo foi publicado originalmente em inglês no site The Conversation por Ray Norris, professor, Escola de Ciências, Western Sydney University.

(Por Redação Galileu)

Astrogildo Aécio Nunes

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